Opinião

Tolstói e uma reflexão sobre pessoas e comunicação

Tolstói e uma reflexão sobre pessoas e comunicação
(Foto: Max Titov)

Terminei de ler Anna Karenina, de Leon Tostói. É fácil entender porque uma obra dessas não perde força através dos tempos: você termina o livro e continua pensando nos comportamentos, pensamentos e sentimentos dos personagens. E quando tenta tirar conclusões acerca dos motivos para as ações e os desfechos da estória, vê que o esforço é precipitado, e que existem mais possibilidades. Não é tão fácil acessar o personagem, compreender o ser humano. Segundo Celia Blue Johnson, em “Conversando com Mrs. Dolloway” (livro cujo título faz referência a outro clássico), nos bastidores de sua criação Tolstói se inspira em personagens reais para escrever o livro. Anna Karenina é a junção de duas mulheres que ele conheceu superficialmente, mas de forma marcante. Segundo outros autores, o outro personagem principal, Konstantin Levin, é inspirado no próprio Tolstói. Isso sem falar do contexto russo retratado na trama.

Mas por que falar de um livro, se o assunto aqui é mercado? Livros como este mostram duas coisas nas quais vale a pena refletir, se você trabalha com “gente” e comunicação. Primeiro, que a inspiração em pessoas reais, com vidas reais, torna sua comunicação mais humana, com mais capacidade de entreter, ou sensibilizar, ou as duas coisas. Neste caso foi um livro marcante baseado em pessoas reais que inspiraram o autor. E na comunicação não faltam exemplos de campanhas de comunicação que foram geradas, ontem e hoje, com base em gente real. Assim, de bate-pronto, me lembro da campanha da “Beleza fora da caixa”, de Dove (https://www.youtube.com/watch?v=-dko9WXJbu0), e da campanha da marca Degree, desodorante da Unilever (https://www.youtube.com/watch?v=-Q2AHsANdSQ&t=22s). É como diz a professora Barbara Kahn, da Wharton School of Business, sobre essa inspiração: “é meio óbvio e intuitivo, mas muito poderoso”.

Em segundo lugar, a leitura de uma literatura dessas demonstra como acessar a mente das pessoas não é simples. Mas é necessário entender como pensa e sente o consumidor, se o profissional quiser alcançar sucesso nas relações entre uma empresa ou marca e seu mercado. Anna, Levin e tantos outros personagens de Tolstói são complexos, e por vezes o leitor acha que os entendeu. E depois percebe que não o fez por completo, e seus comportamentos sofrem reveses. As pessoas não são, as pessoas estão, disse o especialista Walter Longo em um de seus livros. Temos fases e necessidades diferentes em momentos diferentes do tempo. E as empresas deveriam entender isso.

Na pesquisa de mercado, a ordem é ir fundo na compreensão dos comportamentos, motivos e relação entre a pessoa e aquele tipo de solução. Como digo nas aulas, um produto ou marca só ganha impulso no mercado se ele/ela se encaixar na vida do consumidor. E isso só acontece se pudermos acessar o comportamento que vai além da superfície e entender como podemos resolver suas necessidades reais, no âmbito individual e social.

As grandes obras nos dão acesso a personagens que vão além da superfície, e por isso fascinam.  O consumidor também fascina. E conhecê-lo é fundamental.

Tolstói, com seu talento e ideias sociais, provavelmente não veria utilidade neste texto. Mas ele me surgiu por inspiração enquanto consumia seu livro. 

Karlan Muniz

Karlan Muniz é publicitário, mestre e doutor em administração, professor de marketing e comportamento do consumidor. Atua como consultor para análise e pesquisa de mercado.

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