Opinião

Um mero Moro

Um mero Moro

Na última semana os jornais deram uma notícia que causou muito estardalhaço e nenhuma surpresa: Sérgio Moro entrou na política. De fato, surpresa nenhuma: ele sempre esteve na política, mesmo quando era juiz. Aliás, sobretudo quando era juiz. Há quem diga que Moro, no ponto culminante de sua judicatura, definiu a última eleição presidencial. Há quem diga que isso é só maledicência e chororô. Evito aqui essa discussão, que me parece estéril. Bolsonaro venceu a eleição, Moro foi seu ministro, os dois brigaram – e tudo isso já passou. Ou melhor: está passando. E passará até 2022, quando teremos – queira Deus! – uma nova eleição. E então a disputa que Moro, em 2018, evitou que acontecesse. A disputa entre Lula e Bolsonaro. 

E talvez o próprio Moro. Sim, a disputa pode ser entre Lula e Bolsonaro – e Moro. Eis a razão do estardalhaço: Sérgio Fernando pode ser o nome da famigerada terceira via. É verdade que haverá também o Ciro Gomes, algum tucano, um Amoedo da vida, entre outros. Mas há indícios de que a candidatura do ex-juiz pode decolar. Se decolar, pode haver o tal voto útil. Se houver, ele pode chegar ao segundo turno. Se chegar…

Vamos arredondar os números das últimas pesquisas para o primeiro turno: Lula tem pouco mais de 40% dos votos válidos; Bolsonaro, pouco mais 20%; os demais, juntos, pouco mais de 30%. É possível que esses ‘demais’ dividam em muitos pedaços esta terceira fatia dos votos: neste caso, nenhum vai decolar. Mas é possível que um deles desponte e concentre o poderio eleitoral do grande público avesso a Lula e a Bolsonaro. É possível que seja Moro. 

Por quê? Três razões me ocorrem. Mais até do que Bolsonaro, Moro personifica o antilulismo: ele tem grande potencial de crescer graças ao antagonismo ao petista (algo que Ciro Gomes, por exemplo, tem tentado pateticamente). Ao mesmo tempo, Moro personifica o antibolsonarismo: não só porque ambos romperam a vergonhosa união num grave litígio, mas também porque o ex-ministro tem o estereótipo perfeitamente inverso ao do presidente – onde este aparenta vulgaridade, despreparo e instabilidade, aquele aparenta finesse, eficiência e compromisso com as instituições. Mais que tudo, Moro parece ter o apoio tão poderoso quanto obscuro das mesmas altas instâncias, internas e externas, que fizeram a lava-jato estremecer as bases da República. 

Mas talvez não. Talvez Moro não decole. Talvez nem mesmo seja candidato à presidência. Ainda que ele seja o juiz que prendeu Lula, o ministro que desafiou Bolsonaro, o menino comportado sob a longa batuta daquelas altas instâncias, ele não parece ter a força, o ímpeto, a coragem – ou a loucura? – de se expor àquela disputa. Sua pele pálida, seu riso inseguro, sua voz vacilante – tudo isso parece um sinal de sua fraqueza. Há quem diga que é só a timidez de um bom moço. Há quem diga que é covardia. Não sei, não o conheço. Mas não me surpreenderia ao vê-lo candidato, digamos, a uma cômoda cadeira na Câmara ou até no Senado. Ao contrário: acho que isso seria a cara de Sérgio Fernando. Acho, só acho, que ele teme o grande confronto.

A candidatura de Moro, o grande personagem de um dos cruciais capítulos de nossa história, exigirá que ele se defronte com a própria obra. A lava-jato estará sob julgamento. O ex-juiz se sentará no banco dos réus. Sinto que Moro teme esse julgamento. Sinto que treme diante da perspectiva de suportar o veredito da história – um veredito que se precipitará sobre ele caso se candidate à presidência. Talvez eu me engane. Talvez ele seja candidato. Talvez seja o próximo presidente. Mas sinto, apenas sinto, que não. Sinto que Sérgio Fernando, nos próximos capítulos de nossa história, será somente um mero Moro. 

Vítor Véblen

Vítor Véblen é iniciado em literatura política. Viveu em Chicago, onde estudou economia. Mora atualmente em Joinville.

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